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Coluna 92: Fatos & gente são-bentenses de épocas diversas (14)

Publicada dia 28 de Julho de 2007

Fatos & gente são-bentenses de épocas diversas (14)

Divulgar fatos do passado é para nós celebrar e enaltecer a luta dos nossos antepassados por uma cidade desenvolvida em todos os aspectos da atividade humana. Em escritos anteriores, fizemos reparos ao fato de as pessoas de certas posses mandarem seus filhos estudar fora e que nunca se preocuparam em atrair para São Bento, de clima agradabilíssimo, nenhuma associação ou ordem religiosa que aqui se dispusesse a fundar um convento e após dar início aos cursos que formariam professores primários, além de preparar os nossos meninos e meninas para o ingresso em faculdades da capital, a fim de fazer um dos tradicionais cursos de então como direito, filosofia, ciências e letras, medicina e engenharia.

No entanto, jamais imaginaríamos que no limiar do século passado um pugilo de homens cultos e bem intencionados, sob a égide da “Sociedade 21 de Março”, se dispusesse a passar para os mais jovens o conhecimento acumulado nos bancos das escolas e faculdades recifenses. A referida sociedade constituiu-se num marco na vida política, social, literária, esportiva e artística de nossa cidade, fundada em 1900, com as finalidades mais nobres possíveis e tendo à frente as cabeças mais representativas do pensamento de então, homens progressistas que queriam porque queriam ver a então vila, em via de se tornar cidade, dando um exemplo de vigor e de persistência diante das dificuldades de todos os tipos que tinha pela frente.

A “Sociedade 21 de Março” congregava não só os homens mais sábios e esclarecidos do seu tempo, são-bentenses da gema ou profissionais vindos de outras plagas, mas outros idealistas agricultores, pecuaristas e comerciantes que amaram a nossa pequenina urbe e se engajaram na senda desenvolvimentista do século XX, que era anunciado aos quatro ventos como o século das luzes e do conhecimento como de fato foi, malgrado os dois grandes conflitos que envolveram quase todos os países do nosso planeta.

Nesse sentido, a Sociedade 21 de Março era pretensiosa e firme a ponto de possuir diversas atividades para atender as suas finalidades como as seções: “Dramática”, “Esportiva”, “Musical” e “Literária”. Havia, pois, teatro, hipódromo e biblioteca que recebeu muitas doações e que até teve uma verba de cento e cinqüenta mil réis consignada no orçamento municipal para o exercício de 1900. Além dessas seções, a Sociedade editava a “Gazeta de S. Bento”, muito elogiada pela imprensa da capital e de cidades do interior não só pelo esmero na sua feição gráfica como na parte de redação e de estilo. É de justiça lembrar que naquele distante ano de 1900 nossa São Bento, através da “21 de Março”, não mandava para outra cidade as matérias a serem impressas, pois está claro no final de todas edições examinadas que ela era impressa em tipografia própria. Hoje, São Bento, ao que nos parece, não possui uma gráfica em que possa rodar os seus pequenos jornais e informativos.

A edição nº 4 da Gazeta de S. Bento, de 15 de maio de 1900, noticia a posse da primeira diretoria efetiva da Sociedade 21 de Março, composta das seguintes personalidades: presidente, Dr. Eduardo Correia da Silva; secretário, Prof. Rodolfo Jovino de Santana; adjunto de secretário, Capitão Bento Correia Crespo; orador, Major Quintino Alves da Silva Valença; tesoureiro, Rodolfo Monteiro Paiva; diretor da seção literária, Dr. Ildefonso Xavier Rodrigues Esteves; diretor da seção musical, Vigário Joaquim Alfredo da Costa Pereira; diretor da seção dramática, Luiz Nunes de Castro e diretor da seção desportiva, Major José Bento.

Também, foram empossados os novos redatores da Gazeta de S. Bento, a saber: Dr. Eduardo Correia da Silva, Vigário Joaquim Alfredo da Costa Pereira, Dr. Ildefonso Xavier Rodrigues Esteves, Jerônimo Tertuliano de Moraes, coronel Santos Manso e professor Rodolfo Jovino de Santana. Para a função de bibliotecário foi designado o Dr. Augusto Sílvio Barreto. Apenas para ilustrar e clarear, o Dr. Eduardo era o juiz de direito da comarca de São Bento e Dr. Ildefonso um dos dois promotores de justiça da comarca. De acordo com o livro de Sebastião Cintra, “Inocentes e culpados no Tribunal do Júri de São Bento”, o primeiro foi graduado bacharel em direito pela Faculdade do Recife na turma de 1885 e o segundo fez parte da turma de 1898 da mesma instituição de ensino. O Dr. Augusto, que também exerceu a promotoria em São Bento, é da turma de bacharéis de 1894. Como se pode depreender, na época, estavam lotados na vila dois representantes para dividir os encargos do Ministério Público na comarca de São Bento e ambos desempenharam funções na primeira diretoria da “21 de Março”.

A Sociedade 21 de Março não ficou apenas nas suas atividades sociais e esportivas. Os seus membros mais capacitados tinham outros objetivos por demais nobres tal seja o de transmitir conhecimento à juventude são-bentense mais aquinhoada. E na Gazeta de S. Bento, edição de nº 5, datada de 30 de maio de 1900, está escrito o seguinte: “Sendo um dos fins da Sociedade 21 de Março defender a instrução promovendo aulas noturnas, foram criadas as seguintes cadeiras: Português, Francês, Latim, Inglês, Matemáticas (assim mesmo no plural), Geografia, História Geral e História Natural”.

As oito cadeiras foram providas com os seguintes professores: Dr. Augusto Sílvio Barreto, português e francês; Dr. Eduardo Correia da Silva, inglês e história natural; Vigário Joaquim Alfredo, latim e geografia; Dr Ildefonso Esteves, história geral e Rodolfo Santana, matemáticas. E a aulas funcionariam alternadamente de conformidade com as necessidades de ensino.

Infelizmente, até este momento, não nos foi possível saber se esse núcleo de ensino médio prosperou em nossa cidade, assim como não sabemos se a Gazeta de S. Bento parou de ser editada, pois que no Arquivo Público do Estado existem apenas dezoito edições, sendo que a última se refere a março de 1901. Examinamos detidamente a última edição disponível e não vimos nenhuma menção a possíveis problemas com a Gazeta que pudessem fazer cessar suas atividades. Pelo contrário, a disposição de prosseguir na feliz empreitada era visível e além de tudo eles dispunham de tipografia própria e talento necessário para editar um jornalzinho de quatro páginas a cada quinze dias. Pelo conteúdo informativo da Gazeta e se o empreendimento tivesse prosseguido, nós saberíamos muito mais a respeito da nossa gente e da história da cidade nas primeiras décadas do século passado.

De igual modo, nada sabemos a respeito do fim da Sociedade 21 de Março a não ser o fato de ela ter nobres objetivos e visar a movimentar a elite são-bentense, oferecendo aos seus sócios a diversão domingueira representada pelas animadas seções turfísticas ou pelo teatro. Havia uma biblioteca em constante expansão recebendo inúmeras doações de livros, conforme se vê dos agradecimentos publicados em várias edições da Gazeta. Essa biblioteca, como já dissemos, também teve consignada, no orçamento municipal de 1900, a verba de cento e cinqüenta mil reis.

Outro grande acontecimento promovido pela Sociedade 21 de Março foi a construção do Hipódromo Bela Vista, solenemente inaugurado em 15 de julho de 1900. E a Gazeta assim noticia: “(...). É um belo edifício, situado numa bonita esplanada, com vastas acomodações de gosto moderno. As arquibancadas são espaçosas, havendo no pavimento inferior a Casa das Apostas, Gabinete da Diretoria e Buffet que foi arrendado ao nosso consócio Jerônimo de Moraes. A festa de hoje deve ser agradabilíssima e a diretoria tem empregado esforços nesse sentido”.

E prossegue: “O funcionamento da seção esportiva é uma grande conquista da Sociedade 21 de Março, que vai perfeitamente cumprindo sua missão e correspondendo a seus fins. Manda a justiça que entre os sócios que mais concorreram para a bela construção do hipódromo, seja posto em relevo o nome do nosso digno tesoureiro, o Sr. Rodolfo Paiva, que fez os adiantamentos precisos para que as obras chegassem logo ao seu fim. No seguinte número daremos notícia minuciosa da festa inaugural do hipódromo e das corridas de hoje, para as quais foram nomeados os seguintes juízes: de partida – Jerônimo Moraes; de chegada – Coronel Gregório Simões de Macedo; de raia – Gercino Cintra e João Santana e de arquibancada – Coronel João Cintra”.

Em futuro ensaio, discorremos sobre a inauguração festiva do Hipódromo Bela Vista, bem como os diversos páreos corridos, com os nomes dos vencedores e movimento geral de apostas, evento prestigiado pelo povo de São Bento e abrilhantado pela Filarmônica que naquele tempo era, ao que tudo indica, dirigida por Liberato Siqueira que também era membro da Sociedade 21 de Março. A Gazeta refere-se sempre à Filarmônica, hoje mais conhecida como Banda Musical Santa Cecília, cuja existência sesquicentenária poderia ser objeto de estudo, embora saibamos que uma antiga responsável pela nossa instituição ateou fogo nos documentos que poderiam reconstituir a história dessa tradicional instituição.

Na história da nossa urbe, um nome deve ser reverenciado por sua feliz idéia. Trata-se do Dr. Esmeraldino Bandeira que apresentou à Câmara dos Deputados de Pernambuco o projeto de lei nº 21 elevando a vila de São Bento à categoria de cidade. Ele teve o apoio firme e resoluto do Dr. Celso de Souza e o projeto se transformou na Lei nº 440 de 8 de junho de 1900. Nesse mesmo ano, o Dr. Esmeraldino Bandeira, com o apoio maciço de São Bento, foi eleito deputado federal e no Rio de Janeiro teve destacada atuação como político e jurista, sendo hoje nome de rua no Recife e de uma penitenciária e rua na antiga capital da República, prova evidente de que deixou marcas positivas por onde passou. Em nossa São Bento, não sabemos se o nome de Esmeraldino Bandeira está estampado em alguma das poucas placas de rua existentes. Prefere-se dar nomes de rua a presidentes de países estrangeiros ou a personalidades brasileiras que nunca souberam da existência da nossa cidade. E tudo no calor do momento. Em São Bento há nomes de logradouros com pessoas que nunca fizeram absolutamente nada pelo progresso material e moral da cidade, mas que, tão somente, foram pessoas amigas ou parentes dos eventuais donos do poder.

A notícia da sanção da lei foi recebida em São Bento com expressivas demonstrações de júbilo, sendo improvisados diversos festejos públicos com o fim de solenizar o fausto acontecimento como o início de uma era de prosperidade.

E a Gazeta assinala: “Do pátio da Matriz, partiu organizada passeata que, depois de percorrer a cidade, estacionou na sede da Sociedade 21 de Março e tendo cumprimentado em suas residências todas as autoridades dissolveu-se em frente à casa do Vigário Joaquim Alfredo”. Na ocasião discursaram os promotores de justiça. Drs. Ildefonso Esteves e Augusto Barreto, além do Major Quintino.

E São Bento, num lapso de setenta anos, foi uma simples fazenda em 1830, freguesia em 1853, vila em 1860, comarca em 1881, município autônomo em 1893 e finalmente cidade em 1900, demonstrando, dessa maneira, o valor e o vigor de sua gente ordeira e trabalhadora.

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Pau Amarelo PE 28 de julho de 2007

Orlando Calado é bacharel em direito.

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